Segurança Pessoal PDF Imprimir e-mail
Escrito por António Malheiro   
18-Dez-2007

Estando o nosso país a atravessar um período em que preside à União Europeia, muito se tem falado de segurança, nomeadamente dos dispositivos de segurança a individualidades. Embora o nosso país não tenha um histórico signifi cativo de ameaças, violência ou mesmo terrorismo, é evidente que ao termos, em território nacional, individualidades estrangeiras, as possibilidades de tais actos acontecerem aumenta substancialmente e obriga a que todos os 

dispositivos de segurança aumentem de forma a garantir a segurança contra todas as possíveis ameaças. Mas será que Portugal é um país de forte ameaça a empresários, políticos ou individualidades? Penso que todos  concordamos que a resposta é negativa. Mas até quando?
Se já ouvimos, ainda há bem pouco tempo, relatos de presidentes da República a passear com a família na baixa lisboeta, deslocando-se de metro e aparentemente sem segurança individual, também já tivemos conhecimento de raptos de empresários ou familiares e mesmo ameaças físicas a políticos. Então, como protegê-los?
Durante muito tempo o nosso Estado considerou que tal tarefa competia exclusivamente às entidades policiais e militares. Devido à impossibilidade de esses organismos responderem ao aumento de pedidos, principalmente por parte de empresas e particulares, deparámos com a realização dessa protecção por elementos ou empresas a actuarem sem qualquer preparação e sem qualquer enquadramento jurídico.
Em consequência da alteração da legislação sobre a segurança privada, que veio abrir às empresas do sector a possibilidade de realizar a protecção de pessoas na via pública, começámos a ver nos meios de comunicação social, e mesmo nas nossas ruas, elementos destas empresas a realizar este tipo de serviço.
Mas, talvez por defeito meu, na grande maioria das vezes o que vejo são os famosos elementos de fato escuro, óculos escuros, porte físico avultado, tipo ?gorila? e vi, mesmo em reportagens de algumas cadeias de televisão, a sua formação a sair dos carros de armas na mão, em grandes cambalhotas e saltos, tudo com grande aparato.
Não ponho em dúvida que se eles existem e as empresas investem neste tipo de formação é porque terão clientes para os mesmos, mas será que este mercado justifica o investimento por parte das empresas? Não estará em risco de desinvestimento e diminuição de oferta, podendo mesmo acabar com este tipo de trabalho no nosso país? Acredito que a protecção a pessoas será sempre necessária, na consequência das possíveis ameaças que possam surgir e que possam afectar a tranquilidade e a segurança das pessoas, sejam elas políticos, empresários, artistas, simples cidadãos ou até mesmo os peneirentos que querem mostrar aos amigos que têm dinheiro para pagar e até são tão importantes que sofrem ameaças.Nos E.U.A e em alguns países da Europa existe, já há bastante tempo, uma especialização deste serviço denominado ?Executive Protection? que se baseia na necessidade dos executivos empresariais, que principalmente reside na sua protecção, conforto e rentabilização do seu tempo. Este serviço desenvolveu técnicas específi cas para oferecer aos executivos 3 factores principais:
  • 1º Rentabilização ao máximo do seu tempo;
  • 2º Protecção, com discrição e sem aparatos;
  • 3º Conforto.

Pessoalmente, tive o privilégio de ter recebido formação específi ca neste serviço, realizada nos E.U.A., e a oportunidade de o realizar em diversas ocasiões em diversos locais do globo. Poderia resumir, como principal meio de actuar, o planeamento. Este serviço obriga a um planeamento muito detalhado e com a máxima antecedência possível. Este planeamento começa quando o executivo decide realizar a viagem e/ou os contactos. O líder da equipa de segurança, em conjunto com o secretariado do executivo, inicia então a preparação da agenda, de forma a que o tempo dispendido com viagens seja o menor possível, bem como para garantir que as mesmas se realizam prevendo a total protecção do executivo, não só de possíveis ataques, mas também de acidentes.
Após este planeamento a equipa de segurança vai para o terreno e aí confi rma os percursos e respectivos tempos, locais de estadia, refeições e reuniões, de modo a que tudo esteja planeado. Neste planeamento todos os detalhes são vistos e revistos por diversas vezes e o plano de actuação é testado por diversas vezes. O detalhe deste planeamento é tal que uma das difi culdades que uma vez tive foi numa cidade da Polónia para encontrar um hospital em que, durante o período de permanência do meu executivo, tivesse em prontidão uma equipa médica que dominasse a língua inglesa.
Lembro-me, com algum humor, do período de formação em que fomos mentalizados para nos preocuparmos sempre com 3 factores:

  1. Não existirem surpresas;
  2. Nunca estarmos tão perto do nosso protegido que ele se sinta na necessidade de nos apresentar, nem tão longe que, em dois segundos, não estivéssemos a seu lado;
  3. Nunca nos apresentarmos de forma a nos tornarmos um alvo, por exemplo, com fatos pretos, óculos escuros, etc.

Já agora, essa de se utilizar os óculos escuros para não se ver para onde olhamos, já era!
Quanto ao planeamento, temos que compreender que o minuto de um executivo tem um valor elevado, não só para si próprio como para a organização que representa e dirige. Lembro-me que, do largo período em que realizei este serviçopara uma das maiores multinacionais do mercado fi nanceiro global, a única vez em que fui chamado à atenção por parte do CEO desse grupo económico foi em Frankfurt, quando, devido a um erro de planeamento, chegámos ao aeroporto com 45 minutos de antecedência do voo, quando o anteriormente defi nido seria de 15 minutos. Assim, o meu protegido, salientou-me que 30 minutos a mais na espera de um voo era um prejuízo substancial para a organização e para eu não repetir. Por este exemplo podemos verifi car o detalhe em que este tipo de serviço tem de trabalhar. Nada pode ficar ao acaso, principalmente na protecção pessoal do executivo, pois ao efectuarmos uma protecção sem aparatos, com aproximação média, e na maioria das vezes sem armas, qualquer falta de planeamento poderá ser o fi m da missão.

Quanto à protecção pessoal, a fi losofi a da mesma é prever todas as possíveis ameaças, criar um plano de actuação para todas e em todos os locais e, depois, em situação de ameaça, o nosso objectivo é afastar e mesmo retirar o nosso protegido para local seguro e não nos preocuparmos com a ameaça; tal objectivo competirá à equipa de segurança local ou autoridades.

No que diz respeito ao factor do conforto talvez esta parte seja um ponto de grande discórdia para os nossos técnicos de segurança, pois num seminário realizado em Lisboa, ao relatar aos meus colegas este tipo de detalhe e missão, este foi quase unanimemente definido pelos presentes como desnecessário e, até, humilhante para a segurança - mas eu continuo a discordar deles.

O conforto do executivo quando viaja, ou quando se encontra em reuniões exteriores, é importantíssimo para a sua rentabilidade como executivo. Se dormiu mal, se acordou mal disposto pela temperatura ou aspecto do quarto, tudo isto vai infl uenciar o seu comportamento, pondo mesmo em causa bons resultados nos negócios.

Como seguranças de ?executive protection? a nossa missão é garantir à empresa a maior produtividade deste executivo. Para isso temos de o proteger no seu trabalho e garantir que não há desperdício de tempo, mas também temos a responsabilidade de garantir-lhe o máximo de conforto, para que ele possa então cumprir com a sua missão. Portanto, nunca me senti humilhado ou com uma missão menor quando, por exemplo, e caso específico de um executivo que protegi por diversas vezes, ele solicitava um jarro de água morna ao planear as suas reuniões, pois esse era o conforto dele.É evidente que, para tal, as particularidades do protegido têm de ser do conhecimento do líder da equipa de protecção, desde que, claro, sejam necessárias à missão. Para isso, temos de transmitir confiança ao executivo para ele nos confi ar estas particularidades e até, muitas vezes, partilhar partes da sua vida privada.

Quantas vezes, o executivo, à noite ou noutra altura, quer divertir-se ou quer passear ou simplesmente fazer compras para a família? Pois nós também participamos neste lado da sua vida, e se ele não se sente confortável com a nossa presença e participação, ele vai fazê-lo às escondidas e vamos perdê-lo.

Resumindo, o objectivo é não só proteger, mas garantir ao nosso executivo a tranquilidade e boa disposição necessárias para aumentar a sua produção. Assim, cria-se um serviço pró activo, que de despesa pura se transforma em  investimento. É evidente que obriga a uma maior formação dos seus agentes, a um maior profissionalismo e a uma maior preparação (não se admite neste serviço um segurança que não domine algumas línguas, por exemplo).

Pergunto-me se o risco, na grande maioria dos casos dos nosso executivos e no interior do nosso país, justifica o aparato de armas, fatos escuros, equipas de 5 elementos, viaturas blindadas, etc. ?Visto por outro ângulo? não será muito mais apropriado o tipo de serviço referido como ?executive protection? e, até, muito mais ligado à nossa cultura de baixa agressividade? Não consigo ver o executivo português, em Portugal, a sentir-se satisfeito ao ver-se acompanhado pelos ditos ?gorilas?, a dar bem nas vistas e com toda a gente a olhar e a comentar a sua segurança, excepto se o seu objectivo for mesmo dar nas vistas!

Com este serviço, não se apresentaria um maior profi ssionalismo no sector, beneficiando-o, elevando a relação do mesmo com o mercado, melhorando a sua imagem exterior e transmitindo uma ideia de confi ança? Então porque não vemos publicitado no mercado este tipo de serviço? Não interessa às empresas de segurança?

 

Actualizado em ( 10-Jan-2008 )