Promover uma cultura de segurança: qual o papel da informação? PDF Imprimir e-mail
Escrito por António Brandão Guedes   
18-Fev-2009

 Promover uma cultura de segurança: qual o papel da informação?

por: António Brandão Guedes

  A grande aposta da mais recente Convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT)1 sobre segurança e saúde no trabalho (SST) é, sem dúvida, na promoção de uma cultura de segurança como garantia sólida de uma efectiva diminuição dos acidentes e doenças profissionais em todo o mundo. Na preparação desta .........

Convenção e nos tempos posteriores à mesma os documentos da OIT insistem sistematicamente na necessidade de promover essa cultura de segurança como condição essencial para o sucesso no longo combate de prevenção dos riscos profissionais. No espaço da União Europeia a ideia também ganhou foros de cidadania sendo frequente a insistência na necessidade de se apostar na promoção de uma cultura de segurança, investindo nomeadamente na informação dos cidadãos activos e na  ducação com a integração de conteúdos de SHST nos curricula escolar. Estas preocupações estão claramente expressas no último documento da Comissão Europeia sobre a Estratégia Comunitária para a Saúde e a Segurança no Trabalho 2007-2012. Esta preocupação manifestada, quer pela OIT quer pela UE, reflecte de algum modo o acumular de experiência de milhares de pessoas que trabalham na prevenção dos riscos profissionais e na melhoria das condições de trabalho em geral. O combate aos acidentes e doenças profissionais é um combate que exige uma estratégia e uma acção multi-disciplinares e persistentes de longo prazo. A mudança efectiva do comportamento dos empregadores e dos trabalhadores será possível com uma progressiva mudança de mentalidade e de cultura. É aqui que o papel da informação enquanto elemento de sensibilização e de transformação e criação de valores tem um papel determinante.

A informação e participação como princípios da prevenção de riscos profissionais.

O ano de 1989 é uma marca histórica no desenvolvimento da prevenção dos riscos profissionais no espaço comunitário. Para além da adopção da Carta Comunitária dos Direitos Fundamentais dos Trabalhadores é aprovada a Directiva-Quadro2 que constitui um dos primeiros actos de grande alcance social no quadro do Acto Único e estabelece os princípios que irão enquadrar a política de segurança e saúde no trabalho com impacto na legislação de cada Estado-membro.

Neste sentido, toda a acção preventiva passou a ter uma matriz de referência alicerçada num conjunto de princípios fundamentais com destaque para a avaliação dos riscos, integração da prevenção num sistema coerente de gestão, privilegiar a protecção colectiva e formar e informar os trabalhadores. Por outro lado, é estabelecida a consulta dos trabalhadores como elemento essencial de participação e de envolvimento dos mesmos. Estes princípios são transpostos para a legislação nacional através do Decreto-Lei 441/91 de 14 de Novembro, integrando formalmente a nossa prática preventiva.

A partir da ?Directiva-Quadro? a informação dos trabalhadores é reconhecida como um elemento importante para o êxito da abordagem preventiva dos riscos profissionais - informação sobre os riscos concretos e sobre os resultados das avaliações efectuadas, mas também sobre os planos e directrizes da gestão sobre a política de segurança da empresa.

Hoje é consensual a ideia de que a mudança de comportamento dos trabalhadores, chefias e gestores nesta matéria depende, entre outros factores, do sistema de informação/formação existente na empresa. Em determinadas circunstâncias um sistema de informação eficaz pode fazer toda a diferença, como nos casos de uma catástrofe ou emergência.

Mas o papel da informação não se restringe ao espaço da empresa, onde é elemento estruturante de uma cultura de segurança. A construção de redes de prevenção de riscos profissionais exige o desenvolvimento da circulação da informação desde o local de trabalho até ao plano nacional.

O papel dos Parceiros Sociais

Pelo Acordo Social para a SHST de 1991 os Parceiros Sociais assumiram claramente esta questão quando definiram como objectivo específico o desenvolvimento de um sistema de informação sobre a prevenção de riscos profissionais. Reconhecia-se deste modo a importância da informação e divulgação nas empresas e na construção de um sistema nacional de informação que alimentasse e proporcionasse solidez às políticas de SHST. A informação e divulgação técnicas são, assim, uma obrigação de todos os actores e parceiros do sistema de prevenção e não apenas da Administração Pública.

A informação dos trabalhadores no domínio da SHST passa a objectivo importante das empresas e das associações de empregadores e de trabalhadores. Cada parceiro deve utilizar a sua abordagem e metodologia próprias para se dirigir aos destinatários e recolher deles as suas queixas, sugestões e reivindicações.

Existe efectivamente um perfil de informação de tipo sindical ou de uma associação de empregadores. Embora de ângulos diferentes, ambas podem contribuir para uma boa informação e divulgação no domínio da prevenção dos riscos, consolidando pouco a pouco uma cultura de segurança com a consequente adopção de comportamentos seguros e um maior empenhamento dos trabalhadores e da gestão.

A responsabilidade da Administração Pública

Historicamente, a Administração Pública tem assumido a informação e divulgação de SHST como uma das sua  obrigações e objectivos importantes. Nas diferentes soluções organizacionais encontradas, nomeadamente no ex-IDICT e na actual ACT, encontramos sempre a informação como objectivo a prosseguir pelas instituições do Estado  responsáveis pelas políticas de SHST. Estas obrigações ficaram particularmente reforçadas e ampliadas com o Decreto Lei nº441/91, também conhecido por ?Lei-Quadro? da segurança e saúde no trabalho.

A criação da Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho veio reforçar a importância da informação para ?tornar os locais de trabalho da Europa mais seguros?. Esta instituição criou uma rede europeia significativa através de um ?ponto focal nacional? em cada país para reunir e partilhar conhecimentos e informações com o objectivo de promover uma cultura de segurança.

Podemos afirmar que esta Agência veio potenciar a acção informativa da Administração Pública e dos Parceiros, em especial com a instituição das ?Semanas Europeias? e com um lote de estudos e informações qualificadas no domínio da SHST.

Porém, com a dinâmica criada com esta Agência, e em particular com as semanas europeias, colocou-se em cima da mesa uma outra questão cada vez mais pertinente neste domínio: para se promover uma cultura de segurança há que enfrentar um outro desafio - os media; a necessidade cada vez mais imperiosa de se passar a fronteira técnica e de se fazer informação para o cidadão comum, de sensibilizar em larga escala e, inclusive, de chamar a atenção dos jornalistas para a importância da prevenção dos acidentes e doenças profissionais e de promover o bem estar no trabalho.

Este desafio, que a própria Agência Europeia ainda procura vencer, é acompanhado de um outro que é informar, utilizando as novas tecnologias de informação e comunicação, nomeadamente a internet.

A prevenção dos riscos na comunicação social

Colocar hoje a questão do trabalho, e em particular da SHST, nos órgãos de comunicação é um enorme desafio. Se olharmos para a nossa história das últimas décadas verificamos que as temáticas do trabalho foram diminuindo de importância e em alguns jornais até passaram a ser incluídas nas secções de ?economia?. Esta dinâmica é apenas alterada num quadro de greve geral ou de revisão da legislação laboral.

Por outro lado, enquanto uma catástrofe ou até um acidente envolvendo vários trabalhadores pode ser motivo para uma primeira página, dado o seu poder de choque e de sensibilização da opinião pública, as boas práticas de prevenção, as medidas técnicas e organizacionais, bem como as políticas a promover são, em geral, acções do quotidiano e ?não são notícia?. Mas, se esta dinâmica não é favorável, nem por isso o problema se deixa de pôr com pertinência.

Aliás, tal é amplamente reconhecido na Estratégia Nacional para a Segurança e Saúde no Trabalho para 2008-2012, aprovada por Resolução do Conselho de Ministros3.

A Medida 1.5 vai, efectivamente, ao encontro do que temos vindo a dizer quando afirma que os meios de comunicação social são o elo essencial da relação que a Administração Pública deve construir para fazer chegar a mensagem da prevenção ao grande público.

Há aqui uma vontade manifesta em estabelecer uma relação privilegiada com a comunicação social tendo como objectivo demonstrar que o combate aos acidentes e doenças profissionais interessa a toda a população e não apenas aos trabalhadores dos sectores tradicionalmente perigosos.

Todavia, para que esta relação tenha futuro é necessário que, da parte da Administração Pública, exista a vontade e a competência de falar uma linguagem não codificada, por um lado, e de se instituir como fonte de notícia credível e pertinente, por outro. É, assim, necessário estabelecer uma relação permanente com os jornalistas proporcionando-lhes o máximo de informação adequada e a tempo. Aquilo que, por vezes, é muito importante para a Administração é pouco importante para o jornalista ou editor. Por vezes os jornalistas queixam-se de uma certa opacidade das  instituições que, por sua vez, ficam receosas com algumas tendências modernas de ?fazer jornalismo?. Daí uma certa tensão que existirá frequentemente e que não deve ser enfatizada, mas também não deve ser subestimada.

É, assim, necessária muita humildade e vontade de melhorar progressivamente esta relação, na base do diálogo, tendo como objectivo demonstrar que a segurança, saúde e bem estar no trabalho interessa a toda a gente e não apenas  quando estamos perante uma tragédia.

Conclusão

De tudo o que foi dito podemos afirmar que a informação é reconhecida como um elemento central no processo de promoção de uma cultura de segurança - tanto a informação técnica como a informação para a população em geral, veiculada pelos órgãos de comunicação social. Informar em SHST é missão tanto da Administração Pública como dos Parceiros Sociais e de outras entidades da rede de prevenção de riscos profissionais e, também, dos órgãos de comunicação social.

Informar é o primeiro passo para participar. Uma cultura de segurança atinge-se com uma participação sólida que conduza ao empenhamento de todos.

*António Brandão Guedes

Técnico da ACT

Actualizado em ( 19-Fev-2009 )
 
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